quinta-feira, 15 de setembro de 2011

Colin McRae nunca será esquecido


Completam-se hoje quatro anos desde o desaparecimento de Colin McRae, que perdeu a vida aos comandos do seu helicóptero, deixando mais pobre a família dos ralis.

O escocês assegurou 25 triunfos, 42 subidas ao pódio e tornou-se o primeiro britânico a conquistar um título de Pilotos no Mundial, para além de ter juntado ao seu pecúlio ainda três vice-títulos e, claro, 20 abandonos por despiste! Mas, Colin McRae foi também muito versátil tendo passado pelas 24 Horas de Le Mans e pelo Dakar, na altura em que já tinha dado nas vistas também no Todo-o-Terreno. Dez anos depois da sua primeira vitória no "Mundial", em 2003, Colin McRae recordou-nos momentos marcantes da sua carreira

A primeira vitória na Nova Zelândia 1993

Entre as muitas histórias que há para recordar do piloto, talvez a sal primeira vitória no Mundial de Ralis, na Nova Zelândia em 1993, como nos disse Colin McRae há uns anos, em entrevista: "Recordo como se fosse ontem. É um das duas mais gratas memórias da minha carreira, já que foi a primeira vez que venci um rali do Mundial. A outra, ainda mais marcante, foi dois anos depois, no dia em conquistei Campeonato Mundial. Foi uma vitória com enorme significado para todos nós, já que foi também a primeira para a equipa Subaru. Aquela vitória, ao fim ao cabo, acabou por quebrar o gelo. Senti imediatamente que era capaz de repetir a proeza e que não havia nada que me impedisse de me bater pela vitória. Foi excelente para a minha confiança e um impulso decisivo para a minha carreira."

Companheiro de equipa de Ari Vatanen

Dez anos depois da sua primeira vitória em ralis do Mundial, houve uma série de pilotos que marcaram a carreira de Colin McRae. Quando o escocês se juntou à equipa da Subaru começou por ter como companheiro de equipa um dos seus ídolos - o finlandês Ari Vatanen. "Confesso que foi um privilégio ter sido companheiro de equipa de alguns dos grandes pilotos da geração anterior à minha, acabei por beneficiar da sua larga experiência." Esta experiência foi também uma boa fundação para uma carreira de sucesso em que, ao contrário dos vulgares hábitos dos ralis, Colin se manteve invulgarmente fiel às suas equipas.

Encontros e desencontros

Colin reencontrou na Citroen o seu "eterno" companheiro de equipa, Carlos Sainz, depois de cinco anos a defenderem as mesmas cores, primeiro na Subaru e quatro temporadas na Ford. "Durante algum tempo pareceu que não iríamos estar na mesma equipa outra vez, mas afinal o destino fez com que cruzássemos de novo o mesmo caminho. O Carlos parece que continua para sempre, não é ? Para mim foi ótimo tê-lo na mesma equipa, já que me retirava muita da pressão." Apesar de tudo, a relação entre os dois pilotos nem sempre foi fácil, tendo originado algumas divergências a propósito de ordens de equipa. Colin McRae desvaloriza essas desavenças: "Gostava muito de trabalhar com o Carlos, era um piloto muito experiente, e que me dava um excelente apoio, já que normalmente tínhamos a mesma opinião e partilhávamos as mesmas ideias. Era bom estarmos em sintonia."

As mudanças nos ralis

Colin McRae tinha um posto de observação privilegiado da evolução dos ralis nos últimos anos. "Obviamente que muita coisa mudou. No global foi uma aventura que mudou a minha vida e sinto-me muito afortunado por ter feito uma carreira de sucesso por aquilo que começou por ser um hobby. Claro que passou a ser mais a sério pois sempre foi um desporto muito exigente e profissional, mais do que antes. Isto refletia-se sobretudo na adoção de estratégias de corrida mais calculistas e na pressão do tempo e dos resultados. Passou a haver muito pouco tempo para descansar. Apesar de tudo, quando punha o capacete para o shakedown de um rali, o gozo era igual ao que tinha anos atrás. Para um piloto há sempre preferência por alguns ralis. O Rali da Nova Zelândia era um dos meus favoritos porque é um rali de pilotagem pura, sem compromissos, sempre a fundo. Por exemplo no Safari tínhamos que moderar a velocidade e saber gerir e poupar o carro. Suponho que o rali que menos gostava era o de Monte Carlo, discordo das condições em que éramos obrigados andar a um ritmo competitivo. O nível de segurança era muito mau, o que tornava o rali de Monte Carlo muito mais perigoso do que todos os outros, mesmo mais perigoso que a Córsega."


Colin McRae tem também uma visão muito própria do estado atual da modalidade: "Não julgo que as velocidades sejam demasiado elevadas, mas penso que as especificações dos carros deviam ser alteradas para tornar a condução mais excitante e diminuir o peso da eletrónica - ndr, já não foi a tempo do ver já que os regulamentos só este ano foram alterados - Ainda acredito que era importante recuperar algum do antigo espírito dos ralis. Do ponto de vista dos pilotos toda esta nova filosofia de ralis centrados é uma maçada. Guiámos frequentemente centenas de quilómetros inutilmente, para estar sempre a regressar ao parque de assistência central em vez de estarmos a rodar livremente na floresta como fazíamos antigamente. Compreendo que os organizadores têm dificuldade de adaptar este sistema e de descobrir troços competitivos numa área mais restrita. As duplas passagens podem ser uma solução, mas são muitas vezes parte do problema. Veja-se o que aconteceu uma vez na Turquia que tinha os pisos destruídos na segunda passagem. Certamente que o ideal seria fazer mais quilometragem competitiva do que centenas de quilómetros de ligações."

A paixão de voar e o Lamborghini Murciélago

Vencer o Mundial de Ralis em 1995 é a melhor memória de Colin McRae, a pior foi ter perdido o campeonato em 2001 quando se despistou no Rali da Grã-Bretanha. "O acidente na Córsega em 2000 foi grave mas não me afetou muito nem se refletiu na forma como guiava. Talvez me tenha feito pensar mais a sério nos riscos que corremos, mas neste trabalho esse é o estilo de raciocínio que não se pode refletir no modo como guiamos a alta velocidade. Se isso acontecesse era altura de parar."

Além de esquiar, nos seus tempos livres o piloto escocês tem agora uma outra paixão. (Esta entrevista é de 2003) "Adoro voar. Atualmente já posso pilotar helicópteros, mas espero ir aos EUA tirar um brevet para pilotar aviões. Também sou um apaixonado de carros de alta performance, apesar de ser impossível explorar os seus limites em estrada. Na Suiça tenho um Lamborghini Murcielago e na Escócia uma coleção de motos, carros e carros de ralis antigos. Penso que a jóia da coleção é o Subaru com que ganhei o Campeonato do Mundo, mas tenho também o Sunbeam com que iniciei a minha carreira nos ralis, um Nova que é um carro muito importante para mim, um Ford Sierra Cosworth, um par de Escort de Grupo 4, e estou também à espera de um Metro de ralis."

Fora dos ralis, Colin McRae vive agora com a sua família na Suiça: "De Dezembro a Abril é um local fantástico para estar. Vivemos na montanha e passámos o tempo todo a esquiar. A minha mulher, Alison adora esquiar, e a Suiça não está assim tão longe da Escócia, e para os miúdos, Hollie de quatro anos e Jonny com um ano, é um bom sítio para viver." Viver na Suiça é uma das consequências de ter uma folha de ordenado com números avultados, será que Colin McRae continuaria a fazer ralis se ganhasse um décimo deste ordenado? "Ainda adoro este desporto, quer o lado competitivo quer toda a envolvente. Nunca me movi apenas pelo dinheiro. Não sei durante quanto tempo vou continuar a fazer ralis, mas tenho a certeza que não vou parar já. É um desporto repleto de altos e baixos, mas a minha motivação é sempre a mesma. Ainda quero ganhar um campeonato mundial de ralis outra vez."

O escocês que viveu depressa demais

Foi há quatro anos que Colin McRae, então com 39 anos, perdeu a vida num acidente de helicóptero que o próprio pilotava. Com ele seguiam o seu filho mais novo, Johnny, de cinco anos, um adulto e outra criança. Nenhum dos ocupantes sobreviveu ao incêndio que consumiu o aparelho após a queda. A tragédia ocorreu na localidade de Lanarkshire, sul da Escócia, a menos de um quilómetro da casa onde vivia parte da família do piloto - desde 1995 a residir em Monte Carlo.

Tal como Henri Toivonen, também Colin McRae passou toda a sua vida a fintar a morte. Qualquer que fosse o carro, qualquer fosse o cenário, parecia guiar sempre como se fosse a sua última corrida. Dele diziam que era um sobredotado.

O sucesso chegou bem cedo, logo aos 13 anos. Ainda estudante, sagrou-se campeão escocês de motocross, para aos 16 se notabilizar nas provas de slalom. Seguindo as pisadas do pai, Jimmy McRae, cinco vezes campeão britânico de ralis, (81, 82, 84, 87 e 88), o jovem Colin não tardou em redireccionou a sua carreira para os automóveis, disputando o seu primeiro rali aos 17 anos (1986), então ao volante de um Talbot Avenger. Aos 20, conquista o seu primeiro título escocês de ralis. O estilo de condução espetacular rapidamente se tornou na sua imagem de marca, ao ponto de chegar mesmo a ser comparado a Ari Vatanen, o piloto que idolatrava e a quem dizia ir buscar inspiração.

Mister WRC

A primeira aparição no Campeonato do Mundo acontece em 1987, no Rali da Suécia, guiando um Vauxall Nova. Em 1991, junta-se à equipa Prodrive Subaru e bisa no campeonato britânico, dando provas do seu valor enquanto jovem piloto ao vencer todas as provas do calendário de 1992.

Em 1993, ao volante de um Subaru Legacy, assegura na Nova Zelândia a sua primeira de 25 vitórias no Mundial, ajudando a equipa a conquistar três títulos de construtores consecutivos (95, 96 e 97). O ano de 1995 é de glória, pois torna-se no primeiro britânico de sempre a garantir um título mundial de Pilotos. Mais tarde, assegura ainda três vice-campeonatos (96, 97 e 01), sendo terceiro em 1998, ano em que também venceu a Corrida dos Campeões.

Em 1999, muda-se para a equipa M-Sport e passa a guiar um Focus WRC, vencendo nessa temporada o Rali Safari e o Rali de Portugal, para em 2001 falhar por muito pouco aquele que seria o seu segundo título mundial. Em 2003, decide deixar a Ford e assina contrato com a promissora equipa da Citroen, mas sem contudo voltar a conhecer o sabor do sucesso. Quando a esperança de um regresso à Subaru se desfez - devido à entrada na equipa de Mikko Hirvonen -, decide voltar as costas aos ralis. Mas por pouco tempo...

Em 2004, regressa ao Rali de Gales/GB num Skoda Fabia WRC, sendo o sétimo classificado final. Depois, no Rali da Austrália, surpreende ao ser segundo. Falhado o regresso com a Skoda, é chamado em 2006 pela equipa Kronos Citroen para substituir o lesionado Sebastien Loeb no Rali da Turquia. Um problema no alternador deixa-o fora dos dez primeiros. Para Colin, terminavam ali as suas hipóteses de regressar em grande ao Mundial. Para trás ficavam 146 presenças em ralis do Campeonatos do Mundo, 42 subidas ao pódios e 25 vitórias, além de mais de 20 abandonos por acidente, o mais grave dos quais na Córsega, no ano de 2000.

Adepto do espetáculo

Privilegiando sempre a espetacularidade em detrimento de alguma eficácia, a popularidade de Colin McRae viria mesmo a inspirar um dos jogos de computador mais populares dos últimos anos, cuja primeira edição foi lançada na Grã-Bretanha em 1998. Mesmo sem nunca ter anunciado oficialmente a sua retirada da competição, foi com alguma surpresa que se estreou nas 24 Horas de Le Mans e também no Dakar (2004 e 2005) ao serviço da equipa oficial da Nissan. Numa e noutra ocasião, foi obrigado a desistir prematuramente, ainda que depois de chegar a liderar e vencer quatro especiais. O ano de 2007 viu-o regressar uma vez mais ao todo-o-terreno. A convite de Grégoire de Mévius, veio a Portugal disputar o Rali Vodafone Transibérico numa Nissan Pick Up. Mesmo desistindo, a sua prestação convenceu Sven Quandt, não demorando a assinar um contrato com a X-Raid. A sua primeira aparição ao volante do BMW X3 aconteceu na Baja de Espanha, em Julho passado. Quando morreu, preparava-se agora para disputar o seu terceiro Dakar.